Indústria de SC em alerta: revisão de benefícios fiscais ameaça competitividade do setor


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Assunto foi um dos temas debatidos durante o Meeting Comex 2019, evento com programação voltada para as relações internacionais

Um sinal de alerta apitou para a economia de Santa Catarina. Desde que o governo do estado anunciou uma revisão geral dos benefícios fiscais concedidas a diferentes setores produtivos, empresários e instituições representativas temem perda de competitividade frente a outros estados do Brasil. Em um cenário extremo, entidades chegam a prever a saída de grandes indústrias de Santa Catarina caso o governo não recue em aspectos considerados fundamentais.

O assunto foi um dos temas debatidos durante o Meeting Comex 2019, evento sobre comércio internacional realizado em Joinville (SC), com programação voltada para as relações internacionais. Em sua oitava edição, o evento foi organizado pelo Núcleo de Negócios Internacionais da Associação Empresarial de Joinville (Acij), no Centro de Convenções e Exposições Expoville.

Segundo Ricardo Miara Schuarts, sócio-gestor da Küster Machado Advogados, que apresentou o painel “As Perspectivas dos Benefícios Fiscais de Santa Catarina em 2019” no Meeting Comex, a política de concessão de benefícios fiscais é considerada uma das principais responsáveis pelo crescimento na arrecadação do ICMS em Santa Catarina durante a crise econômica da década atual. Ele acrescenta que o estado teve o maior incremento no período desde 2011 (53%) quando comparado com as demais unidades da federação do Sul e Sudeste. O Paraná, por exemplo, teve incremento de 46% enquanto São Paulo, o estado mais rico do país, cresceu 15% na arrecadação do imposto estadual.

Segundo ele, o que salta aos olhos é que o volume de receitas do estado cresceu de R$ 15,1 bilhões em 2011 para R$ 25,1 bilhões em 2017, ou seja R$ 10 bilhões a mais. “Enquanto isso, os incentivos representaram R$ 5,6 bilhões, apenas 31% a mais do que em 2011, ou seja, enquanto as receitas cresceram 66% em seis anos, o volume de incentivos aumentou apenas 31%, menos da metade”, explica Scharts.

Na exposição do tema ao público do evento, a equipe da Küster defendeu a união da classe empresarial para debater o assunto, reunindo pleitos conjuntos por setor na hora de conversar com representantes da Secretaria de Estado da Fazenda. O grupo de advogados defende ainda a implementação de políticas internas para reverter uma possível queda geral dos benefícios fiscais em Santa Catarina.

Análise de renúncias

Para analisar as renúncias fiscais concedidas em Santa Catarina, o governo do estado instituiu, em fevereiro, o Grupo de Trabalho de Benefícios Fiscais. Coordenado pela Secretaria de Estado da Fazenda, a equipe é composta por titulares das Secretarias de Estado da Casa Civil e da Administração, além da Procuradoria Geral do Estado.

O objetivo, segundo o governo, é cumprir os limites estabelecidos pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada em agosto de 2018, que prevê redução gradual da renúncia fiscal de 2019 até 2022, fixando o limite máximo de 16% da receita bruta de impostos. “Estamos trabalhando para atender os preceitos da LDO, diminuindo o percentual de benefícios fiscais, contudo, sem prejudicar o setor produtivo nem os consumidores catarinenses”, diz o secretário de Estado da Fazenda, Paulo Eli.

A renúncia fiscal abrange, além das isenções, os créditos presumidos, as reduções de base de cálculo e outros incentivos fiscais que reduzem o montante do tributo a ser arrecadado. No ano passado, os benefícios fiscais concedidos em Santa Catarina totalizaram R$ 5,8 bilhões, correspondendo a 25% da receita estadual. Para este ano, a previsão é reduzir R$ 750 milhões.

Em dezembro de 2018, foram publicados os decretos 1.866/2018 e 1.867/2018 com a revogação de benefícios fiscais concedidos a diversos produtos. “Foi necessário que todos os itens voltassem a ter o mesmo percentual de ICMS para, em seguida, considerar em quais casos manteremos a renúncia ou não”, explica o secretário da Fazenda. Segundo ele, estão sendo revistos os benefícios que apresentam alguma distorção.

Cresce arrecadação

Um dos principais questionamentos das entidades representantes do setor produtivo são os motivos que levam à nova política de redução de benefícios fiscais mesmo com o crescimento da arrecadação em Santa Catarina. Em 2018, a receita corrente bruta de ICMS, IPVA, ITCMD e demais taxas estaduais foi de R$ 26,1 bilhões, alta de 13,3% em relação ao ano anterior, conforme dados da própria Secretaria de Estado da Fazenda. O maior tributo arrecadado foi o ICMS com R$ 19,4 bilhões, um crescimento real de 13% em relação a 2017.

Em 2018, os setores que apresentaram maior crescimento no recolhimento de ICMS foram redes de lojas (29,3%), automação comercial (22,7%), automóveis (17,5%) e transportes (12,5%). Três setores apresentaram queda na arrecadação: embalagens e descartáveis (-0,5%), comunicações (-5,23%) e agronegócio (-14,4%). A queda no agronegócio é principalmente em decorrência dos 11 dias de paralisação dos caminhoneiros, no primeiro semestre do ano passado.

Setor produtivo reage

Uma das principais entidades a demonstrar preocupação com o plano de revisão de benefícios fiscais anunciado pelo governo foi a Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc). A primeira reunião da entidade com o governador Carlos Moisés ocorreu alguns dias depois do anúncio da revisão, juntamente com o Sindicato das Indústrias de Laticínios e Produtos Derivados (Sindileite), um dos setores mais preocupados com o tema.

O presidente da Fiesc, Mario Cezar de Aguiar, manifestou a importância do setor produtivo participar do debate. “É extremamente importante que tenhamos uma política de incentivos que dê condição de competitividade ao estado. Não queremos que haja privilégios, mas condições igualitárias de concorrência”, argumentou.

O  assunto acabou virando tema de esclarecimento na Assembleia Legislativa. A convite dos deputados, Paulo Eli alertou para a situação crítica das contas estaduais e para o risco de atrasos em salários se não fossem tomadas medidas para recomposição das receitas. Ele argumentou que o governo tem feito esforços para a redução de custeio, mas que enfrenta desafios para manter a situação fiscal equilibrada.

De acordo com o presidente da Câmara de Assuntos Tributários da Fiesc, Evair Oenning, a entidade entende que incentivos fiscais representam atração de investimentos e geração de empregos, dois dos itens mais importantes para o crescimento da economia. A entidade intermediou e esteve envolvida em reuniões com diferentes setores que já sentaram à mesa com a Secretaria da Fazenda para expor questões de competitividade. Segundo Oenning, em cada um dos encontros, os setor produtivo tem tido a garantia da manutenção de benefícios equivalentes aos estados vizinhos do Paraná e Rio Grande do Sul.  “Não adianta reduzir a renúncia fiscal sob o argumento de ampliar a receita e perder indústrias e postos de trabalho. Não faria o menor sentido”, dispara o executivo.

O primeiro segmento a ser atendido pelo governo sobre o novo modelo de política industrial de Santa Catarina foi a indústria têxtil. A reunião contou com a presença dos Sindicatos das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex); Patronal Têxtil de Brusque e Região (Sifitec); das Indústrias de Fiação e Tecelagem de Brusque e Itajaí (Sindivest), além de empresários do ramo. Santa Catarina oferece um benefício fiscal que reduz o ICMS do setor têxtil para 3%, para artigos produzidos no estado. Em 2018, os incentivos fiscais destinados somente a esse segmento somaram R$ 1,2 bilhão. “A proposta é manter a alíquota, com isonomia, evitando distorções. O setor é um dos que mais gera empregos no estado, com 22% das vagas somente na indústria”, garantiu o secretário de Estado da Fazenda.

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